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Dependente químico que sofreu agressões físicas e psicológicas em clínica de reabilitação será indenizado

O Centro de Reabilitação em Dependência Química Recanto dos Arcanjos foi condenado a pagar R$ 20 mil a Emerson Francisco de Resende, a título de indenização por danos morais, em virtude da má prestação de serviço oferecida pela clínica de reabilitação, bem como pelas agressões físicas e psicológicas por ele sofridas no local. A decisão é do juiz Marcus Vinícius Ayres Barreto, da 2ª Vara Cível, das Fazendas Públicas, de Registro Público e Ambiental da comarca de Catalão.

Conforme os autos, em 7 de novembro de 2014, Emerson se internou na clínica de reabilitação tendo por objetivo se submeter a tratamento contra dependência química num programa de recuperação com acompanhamentos psicológicos e médicos, ao valor de R$ 1 mil por mês. Entretanto, no período de 180 dias, acabou sofrendo várias formas de agressões. Além das agressões físicas, ele conta que lhe eram ministradas doses excessivas de medicamentos, mediante emprego de violência, mantendo-o desacordado por dias.

Relatou ainda que foi torturado e mantido em cárcere privado e somente autorizado a receber visitas de familiares com acompanhamento de monitores, bem como não recebia alimentação adequada e era obrigado a fazer serviços pesados de limpeza, inclusive, retirando fezes de cavalos, apontou a falta de capacitação dos empregados da clínica e a precariedade das instalações.

Narrou ainda nos autos que foi impedido de sair da clínica e que os prepostos da ré não o levaram na data marcada para se submeter à perícia no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), deixando de auferir mais de dois meses de benefícios previdenciário, além de entender fazer jus a restituição do que pagou à falta de prestação adequada do serviço. Com isso, requereu a procedência e condenação da ré.

A clínica foi citada, momento em que contestou a acusação, discorrendo inicialmente sobre a filosofia de trabalho, profissionais contratados, abordagem terapêutica. No mérito pediu a improcedência da condenação, inclusive, por litigância de má-fé ou adequados os pedidos aos parâmetros legais, além de produção de provas.

Decisão

Ao analisar os autos, o magistrado argumentou que ficaram comprovados nos autos que o autor sofreu agressões físicas e psicológicas nas dependências da clínica, situação essa corroborada por uma das testemunhas que esteve internada no mesmo local e de uma terapeuta. Ressaltou que ficou provada de forma incontroversa e lamentável a falha do estabelecimento destinado à recuperação de dependentes químicos na prestação de relevante serviço na área de saúde devendo, nesse caso, a ré responder objetivamente pelos danos causados.

“O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”, pontuou. De acordo com ele, o dano moral está evidenciado na dor e sofrimento causados pelas agressões sofridas e também pela frustração decorrente de flagrante falha na prestação do serviço, restando configurados os elementos suficientes para atestar o efetivo constrangimento à esfera moral ensejadores do dever de indenizar. Veja decisão (Centro de Comunicação Social do TJGO)

STJ afasta insignificância por contrabando de arma de brinquedo

Devido ao risco à segurança e à incolumidade pública, não é possível aplicar o princípio da insignificância no crime de contrabando de arma de brinquedo capaz de ser confundida com uma verdadeira.

A decisão é da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que havia aplicado o princípio da insignificância.

De acordo com os autos, o réu foi abordado por policiais militares na posse de mercadorias de origem estrangeira desacompanhadas de documentação que comprovasse o recolhimento dos tributos. Além das mercadorias, ele também teve apreendida uma arma de brinquedo, que, conforme o exame pericial, poderia ser confundida com arma verdadeira.

Em primeira instância, o homem foi condenado por contrabando, mas o TRF-4 concluiu pela atipicidade da conduta, em razão de insignificância penal. Para o tribunal, tratando-se de importação de apenas uma arma de fogo, ainda que a peça pudesse ser confundida com armamento verdadeiro, o dano ao bem jurídico era mínimo, mesmo porque a arma foi apreendida.

Ao restabelecer a condenação, o relator do recurso especial do Ministério Público Federal, ministro Jorge Mussi, destacou que o artigo 26 da Lei 10.826/03 estipula que são vedadas a fabricação, a venda, a comercialização e a importação de brinquedos, réplicas e simulacros de armas de fogo.

Por esse motivo, explicou o ministro, a importação de arma de brinquedo capaz de ser confundida com peça verdadeira configura o delito de contrabando, especialmente em virtude dos riscos à segurança e incolumidade públicas.

O relator também relembrou entendimentos anteriores do STJ no sentido da impossibilidade, nesses casos, da aplicação do princípio da insignificância, tendo em vista a vontade estatal de controlar a entrada de determinado produto em benefício da segurança e saúde públicas.

“Constata-se que o tribunal local, ao decidir pela aplicação do princípio da insignificância na importação de simulacro de arma de fogo, dissentiu da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça sobre o tema”, concluiu o ministro ao restabelecer a condenação por contrabando. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1.727.222

Nem todo atraso ou inadimplência na quitação de pensão alimentícia se traduz em crime

A 4ª Câmara Criminal do TJ manteve decisão que rejeitou denúncia contra um homem pela prática do crime de abandono material, consubstanciado na inadimplência temporária da pensão alimentícia devida aos filhos. O argumento do juiz, mantido pelo colegiado, é de que os fatos criminosos imputados não foram descritos suficientemente na peça acusatória.

O desembargador Alexandre d’Ivanenko, relator da matéria, explicou que o Ministério Público aponta que o denunciado não honrou com o pagamento da pensão alimentícia, todavia não indica as razões que motivaram o réu a faltar com sua obrigação. “Assim, forçoso reconhecer a inépcia da denúncia, porque não foram descritos suficientemente os fatos criminosos imputados ao denunciado, violando, por conseguinte, os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e da dignidade da pessoa humana, já que o réu se defende dos fatos especificamente narrados”, anotou.

Segundo o relator, não basta dizer que o inadimplemento se deu sem justa causa se tal circunstância não está demonstrada nos autos com elementos concretos. “Do contrário, toda e qualquer inadimplência alimentícia será crime e não é essa a intenção da Lei Penal”, concluiu o desembargador. A decisão foi unânime (Recurso em Sentido Estrito n. 0002159-40.2014.8.24.0014).

TJSC

Violência e pobreza, duas faces da mesma moeda

Relacionar violência à pobreza é algo muito complicado, pois as pessoas, com seus julgamentos apressados, dirão que estou afirmando que todo pobre é criminoso, o que não é verdade.

Para esclarecer melhor essa íntima relação entre violência e pobreza, necessário analisar um pouco o Atlas da Violência 2018.

O Atlas é documento realizado pelo IPEA e FBSP e traz vários dados sobre as mortes violentas no Brasil, todos eles voltados “para melhor compreender o processo de acentuada violência no país” (p. 3).

Várias informações se destacam, dentre elas a de que no ano de 2016 chegamos ao número de 62.517 mortes, ou seja, “30,3 mortes para cada 100 mil habitantes, que corresponde a 30 vezes a taxa da Europa” (p. 3).

Em 10 anos, 553 mil mortes violentas.

Mais ou menos 55 mil por ano!

Também chama atenção o fato de que, em 2016, o homicídio representou 56,5% das mortes de homens entre 15 a 19 anos.

E “que 71,5% das pessoas que são assassinadas a cada ano no país são pretas ou pardas”. (p. 4).

Há, ainda, no Atlas, uma análise sobre o impacto do Estatuto do Desarmamento no número de mortes.

São muitas informações e, por isso, cada um desses assuntos será objeto de um texto individual e o tema do texto de hoje, como já dito, é a direta relação entre pobreza e violência.

Não se trata de justificar a violência com a pobreza, muito menos dizer que quem é pobre comete crime. O objetivo é apenas demonstrar que há relação direta entre elas e que é preciso diminuir o nível de pobreza, aumentando a presença do Estado, para, consequentemente, diminuir a violência.

De acordo com os dados contidos no Atlas, “as dez cidades com maiores taxas de assassinatos no Brasil têm nove vezes mais pessoas na extrema pobreza do que as cidades menos violentas”.

Segundo o estudo elaborado pelo Ipea e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgado nesta sexta-feira (15), os dez municípios com mais de 100 mil habitantes e com menores taxas de homicídios têm 0,6% de pessoas extremamente pobres, enquanto os dez mais violentos têm 5,5%, em média. No total, o Brasil tinha 309 municípios com mais de 100 mil pessoas em 2016.

A porcentagem de pessoas sem saneamento básico é de 0,5% nas cidades menos violentas e de 5,9% nas mais violentas. A taxa de desocupação de jovens também é maior nas cidades com mais assassinatos

Portanto, afirmar que a violência diz respeito única e exclusivamente à vontade do agente, desconsiderando todos os fatores sociais, econômicos, familiares, …, é simplificar demais o complexo mundo do crime.

Nesse sentido,

Para a diretora executiva do Fórum Brasileiro da Segurança Pública, Samira Bueno, “a edição do Atlas com dados municipais tenta jogar luz a um componente da violência letal que diz respeito às condições socioeconômicas das pessoas mais atingidas pela violência”.

“Basicamente mostramos que municípios com melhores níveis de desenvolvimento – e aqui falamos de habitação, educação, inserção no mercado de trabalho, dentre outros – também concentram menores índices de homicídio. Ou seja, estamos falando de pobreza, mas principalmente, estamos falando de vulnerabilidade econômica e de desigualdade”, afirma.

Para Samira, os indicadores mostram o “equívoco de políticas de enfrentamento da violência focadas apenas no policiamento e em estratégias repressivas”.

“O estado não é capaz de oferecer condições básicas de vida e cidadania para parcelas significativas da população, e justamente essas pessoas, que vivem em condições de inserção precária no mercado de trabalho, evadem da escola muito cedo, habitam em territórios sem infraestrutura são os que mais ficam vulneráveis à violência”.

Não se engane, a violência é companheira da pobreza, são duas faces da mesma moeda e para resolver uma é preciso atacar a outra.